BAIANINHO & A FUNDAÇÃO DO SINDICATO DOS CONDUTÔRES AUTÔNOMOS. (IRINEU CARLOS DE OLIVEIRA PRADO)

Sempre disse que uma das grandes honras que levarei comigo para sempre — até quando me apresentar ao Supremo Julgador — é ter colaborado com a fundação de quatro Sindicatos de trabalhadores em Rio Claro, e um em Piracicaba. Isto em entidades para as quais redigi inclusive o edital de convocação da assembléia de fundação da Associação Profissional, que, antes da atual Constituição, deveria preceder o Sindicato. Sem contar outras em que apenas dei algumas sugestões e forneci modelos de editais, atas, estatutos, etc.

Mas a fundação do Sindicato dos Condutores Autônomos — o primeiro que ajudei a fundar — teve um principiar insólito.

No mês de janeiro ou fevereiro de 1972, numa tarde de sábado, estava eu no meu escritório, na época à Avenida 2 nº 118, conjunto 7, em prédio que ainda existe, e em sala onde hoje trabalha conhecido e eficiente engenheiro de nossa cidade. Deveria estar adiantando algum serviço, ou estudando, não me lembro. Foi então que um rapaz de seus 25 anos, de sotaque e aparência nortista, com tique nervoso de piscar freqüentemente um dos olhos, e de alcunha “Baianinho” segundo soube depois, procurou-me, com uma intimação. Era para comparecer alguns dias depois, na Delegacia de Polícia de Cardoso, região de Rio Preto, com o fim de  prestar esclarecimentos.

Eu estava iniciando na Advocacia e, louvando-me apenas nas informações do próprio “ Baianinho”, acreditei na sua versão dos fatos e, contratados os honorários, concordei em acompanhá-lo, conduzidos ambos por um táxi do João Ismael Bortolim. Na época João Ismael era do Ponto do Mercado, e hoje, depois de já ter sido comerciante de veículos,  é caminhoneiro, além de músico (é  exímio sanfoneiro), e grande pé-de-valsa.

Na Delegacia de Cardoso — que, segundo o Dr. Luisinho Arruda me disse um dia, de tão longe, não fica perto de lugar algum —  a situação era bem diferente. Meu cliente estava envolvido, com outras pessoas de Rio Claro, na compra de porcos com cheques sem fundos,  e acabou ficando preso, juntamente com outro rioclarense, que levara em carro próprio, para acompanhá-lo nos esclarecimentos ao Delegado, o Dr. José Carlos Rocco. Havia um terceiro envolvido, que já prestara esclarecimentos e estava sendo colocado em liberdade, também de Rio Claro.

Diante da situação, coube-me apenas ajuizar uma ação de “ Habeas corpus”  sob fundamento de que “Baianinho” estava sendo injustamente preso, sem flagrante e sem ordem judicial. Procurei despachar pessoalmente com o Juiz da Comarca, que estava exercendo jurisdição cumulativa com outra, e não se encontrava no Fórum Protocolei a petição, que deve ter sido acolhida, pois o cliente me procurou dias depois.

O fato é que deveríamos voltar para Rio Claro, o motorista, João Ismael, eu, o Dr. Rocco  e, por solidariedade o outro rioclarense. Era um Fusca, táxi mirim, sem o banco de passageiro da frente, de sorte que coube ao libertado, cujo nome não me parece adequado revelar,  vir sentado no assoalho do carro, onde deveria estar o banco retirado.

Foram seis ou mais horas de viagem e, para passar o tempo, conversamos de tudo: política, futebol, Justiça, os fatos determinantes da atividade policial em Cardoso, etc. Até que, numa certa hora, João Ismael falou do serviço dele. Dizia que, como ainda não havia taxímetros nos carros de aluguel em Rio Claro, estava sendo desenvolvida uma campanha prejudicial à categoria, no sentido de que os preços cobrados ficavam por conta dos taxistas, que estariam cobrando o que queriam, sem qualquer tabela. João Ismael,  rapaz esclarecido, ponderava que estava muito difícil para os taxistas se defenderem da campanha, por falta de uma entidade representativa que pudesse, em nome deles, tratar do assunto na Prefeitura e em outras esferas, inclusive órgãos de imprensa.

E João Ismael, também filho de ferroviário, e conhecedor da atividade sindical de meu falecido pai, acabou por indagar-me se eu não podia ajudar os taxistas a se organizarem sindicalmente. Aceitei  o serviço.

Após algumas reuniões no meu escritório, foi convocada assembléia de fundação, no salão da Associação Comercial, para o dia 10 de março de 1972, quando foi fundada a Associação Profissional dos Condutores Autônomos de Veículos Rodoviários de Rio Claro, posteriormente transformada em Sindicato, com a Carta Sindical (que hoje não mais existe) concedida pelo Ministério do Trabalho em  04 de novembro de 1976, data equivocadamente considerada pelo Museu Histórico de Rio Claro, que edita a agenda rioclarense, como sendo de fundação do Sindicato, o  qual na verdade já estava fundado antes, como Associação Profissional. O que era exigência de legislação anterior à Constituição atual, como esclarecido acima.

João Ismael foi eleito o primeiro presidente da Associação Profissional, posteriormente presidida por José Carlos Fuzaro, após transformação em Sindicato, e pelos saudosos Waldemar Carminatti, e Silvio Campião. O Sindicato é presidido  atualmente pelo Mario Pedersen (Marinho), com sede própria na rua 15 nº    908, prestando relevantes serviços a seus associados: taxistas, caminhoneiros, perueiros, todos motoristas autônomos.

Como teria sido a fundação do Sindicato se Baianinho, convocado pela Delegacia de Cardoso, não me contratasse, permitindo-me conhecer João Ismael, e o seu interesse sindical ?

Devo registrar uma coincidência: Cardoso foi a minha primeira Comarca, como Juiz de Direito de 1ª. Entrância,  para a qual fui nomeado tão logo findo meu estágio como Juiz Substituto, em novembro de 1981.

(O autor é Desembargador Aposentado do Tribunal de Justiça de S. Paulo, advogado militante, e Membro Efetivo da Comissão do Cooperativismo – OAB – Secção de S. Paulo. E-mail: oliveiraprado@aasp.org.br)

 

 

(18/02/08)

 

(OUVI DIZER … Baianinho e a fundação do sindicato dos condutores autônomos doc)

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