NOVOS CASOS

DESQUITE PARA USO PRÓPRIO. Numa das Comarcas em que atuei como Juiz Substituto, em início de carreira, portanto, ouvi de antigo e atuante advogado que seu filho, brilhante e recém formado em faculdade de renome, estava-se especializando-se em Desquite Para Uso Próprio. Seja lá o que isto poderia significar.

Tempos depois, ouvi do jovem advogado que a primeira audiência em que atuara sozinho, foi sob minha presidência, e que eu o deixara atuar, sem nervosismo. Tive que dizer-lhe que isto se devera às suas qualidades até hereditárias, e não a mérito do Magistrado.

DIGA AGORA. Em certa demanda trabalhista, o Magistrado não se mostrava muito interessado em sentenciar o feito. Mas evitava declarar seu impedimento, e não se cansava de determinar que ora uma, ora a outra parte, que dissesse, em despacho que os advogados bem conhecem: Diga o Autor, e depois, Diga o Réu, e assim por diante.

Foi assim até que o advogado de uma das partes, mais ousado ou mais cansado de tanto ouvir Diga, disse em famosa petição: “Tudo que me competia dizer, já o disse. Diga-o agora Vossa Excelência.”

Mas o que precisava ser dito (proferir sentença) só o foi por Magistrado especialmente designado pelo Tribunal.

TAMANHO NÃO É DOCUMENTO. Ao tempo em que meu falecido pai foi Secretário do Sindicato dos Ferroviários, há bem sessenta anos, foi procurado na sede, em Campinas, por associado de Dois Córregos, disposto a demitir-se da entidade.

Não se conformava que os advogados do Sindicato e o da Estrada de Ferro tivessem chegado no mesmo trem; almoçados juntos no carro restaurante; que o advogado sindical fosse de baixa estatura e da Paulista um grandalhão; e que este – na audiência – falara muito e o advogado do Sindicato quase que ficou calado.

O velho Irineu teve que lhe esclarecer os fatos. Só poderiam os advogados chegar de trem na sede da Comarca; não eram inimigos e bem poderiam, no mesmo e único horário de trem, viajarem juntos, e tomarem refeição à mesma mesa. O advogado do Sindicato detinha qualidades que se sobrepunham à sua estatura; e que o no processo, e naquele feito, importava o escrito, e não a oralidade.

O associado voltou à sua cidade um pouco mais animado. E teve o gesto educado de escrever ao Sindicato, satisfeito com o êxito de sua reclamatória. E não mais quis demitir-se.

BRIGA CANINA. Ação movida pela tutora de uma cadela de raça, contra proprietário de um Hotel Pet, postulando perdas e danos. No fórum Cível Central de S. Paulo. Fundamentava-se o pedido porque este último permitira que um vira latas emprenhasse sua tutelada, o que muito a desvalorizara.

Na sentença, o Magistrado, com humor e propriedade, anotara: “pois é, os cachorrões brigando e os cachorrinhos se amando.”

EM BAIXO DA TERRA. Nos anos oitenta em que nada no Judiciário remetia à portabilidade, foi este articulista, titular de uma Vara Cível, à residência do interditando, para ouvi-lo, na forma processualmente prevista. Era quase uma caravana: a kombi que era usada por todos do fórum, o motorista, a escrevente de sala, eu, e a gigantesca máquina de escrever Olympia.

Havia pessoas na sacada, e o casa parecia ser sobrado. Indagado pelo interditando, acenaram ao que nos pareceu ser o andar inferior, e entendemos que ele estaria na parte de baixo. Pedimos que abrissem a porta, então. Foi aí que veio o esclarecimento: o interditando estava embaixo da terra, morto e enterrado há alguns dias. Ligeiro defeito de comunicação.

O Autor é Advogado militante na

Comarca de Rio Claro (OAB/SP 25.686) e Desembargador Aposentado (TJ/SP).

E-MAIL: oliveiraprado@aasp.org.br

www.oliveirapradoadvogados.com.br

Publicado em 04/04/2024,  Jornal Cidade (Rio Claro/SP), Página 02.

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