31 DE MARÇO OU 1º DE ABRIL (2)

Na sessão Camarária de 11.04.14 quando os Vereadores e Suplentes foram desagravados, em decorrência da injustiça que lhes foi perpetrada em abril de 1964, foi-me dado a honra de usar da palavra, em nome de minha família, porquanto Irineu de Oliveira Prado, um dos vereadores cassados, já estava na Eternidade.

Minhas singelas e emotivas palavras foram publicadas na imprensa local, publicadas na revista do Arquivo Histórico, que produziu CD significativo histórico dos fatos.

Os afastados foram-no sumariamente, sem direito de defesa, e sem que nada de ilegal ou imoral tivessem praticado. Injustiçados apenas por serem filiados a partidos políticos que apoiavam o presidente deposto (João Goulart).

A decisão injusta e autoritária, revogada pela Resolução 296/2.014 do Legislativo Rioclarense (vide artigo anterior, publicado na “Cidade” de 30 último) foi tomada para agradar os poderosos vencedores do Golpe Militar que depôs Jango, afastou da vida pública inúmeros adversários e instalou a ditadura.

Vejam como são as coisas. Os generais que assumiram no lugar Jango só retiraram direitos dos que, supostamente estavam a ameaçar a democracia. Os vencidos, contra quem se atribuía vocação de comunizar o país, nenhum perigo ou resistência real ofereceram. O que a propaganda federal chamou de guerrilha, não passou de movimento poético de jovens idealistas, massacrados literalmente.

Os que foram presos e cassados sofreram por crime que não cometeram. Meu pai, cujo penar não deve ter sido diferente do sofrido por tantos outros: foi preso no dia de seu 42º aniversário (05/04/64), por 15 dias; em 28/06/64 foi afastado de seu emprego na Companhia Paulista de Estradas de Ferro, por força de  Inquérito Judicial Trabalhista para apuração de suposta falta grave (prática de atos subversivos) visando seu  despedimento por justa causa. Procedimento, à época, exigido para despedir empregado estável (com mais de dez anos no mesmo emprego). A estabilidade no emprego acabou desaparecendo com a instituição do FGTS – Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, em janeiro de 1.977.

Ficou 28 meses sem receber salário, o período de duração do Processo Trabalhista, onde se decidiu inocorrer a tal prática de atos subversivos, e que, se ocorridos, isto não seria falta grave, à luz do que a C. L. T. estabelecia na época.

Sem receber salário, com mulher e filhos que dependiam de seu salário para sobreviver, não é difícil supor o quanto padeceu. Valeu-se de seus limitados conhecimentos de pedreiro, Carpinteiro e vidraceiro. Auferiu com isto, muito menos do que seus salários como Chefe de Trem.

Eu que cursava o colegial Clássico pela manhã no Ribeiro, e o Colégio Técnico de Contabilidade à noite no Alem, precisei desistir do curso diurno, e comecei a trabalhar para ajudar a família. Meus quatro irmãos eram menores.

O velho Irineu foi vitorioso no Processo Trabalhista, e sua prisão não deu causa a processo crime, por falta de amparo legal. O ato da Câmara reconhecendo a Injustiça, em tese, ensejaria pleito de reparação de danos. A família entendeu que eventual indenização macularia toda a glória de ter enfrentado, sobrevivido aos poderes patrocinados pela Ditadura, e vencido. Tanto que foi eleito Vereador para duas legislaturas seguintes.

O vil metal obtido desta forma poderia até reduzir o orgulho ensejado pela discreta atividade política de Irineu pai.  Decidiu-se perdoar os que causaram mal à família. Claro que ficou magoada, pois perdão (como disse Lupicínio Rodrigues) não apaga a mágoa.

 (O Autor é Desembargador Aposentado (TJ/SP) e

Advogado militante nesta Comarca (OAB/SP 25.6.86).

E-mail: oliveiraprado@aasp.org.br

www.oliveirapradoadvogados.com.br

 

Publicado em 13/06/2019, Jornal Cidade, Página 02.

Você pode gostar...

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *