A LOUCURA É DELA, DR.

Os que me conhecem sabem que integrei a Magistratura Paulista. Entre 1.979 e 2.000 fui de Juiz Substituto a Desembargador, quando me aposentei. Tenho isto como justo orgulho de minha vida, e honra que me acompanhará até quando meus olhos não mais se abrirem.

Durante vinte e dois anos acumulei um sem número de cópias de sentenças e de votos, estes quando atuei em Segunda Instância, a partir de 1.994. Agora tenho sentido falta de espaço, também por conta do arquivo de meu escritório de advocacia. Tomei coragem de fazer o que há anos me propusera: selecionar as decisões, confirmadas ou não pelo Tribunal, ou votos que tenham merecido o acolhimento ou em que eu fui vencido.

Esta escolha, muito mais a meu sentir, naquilo que suponho merecesse um comentário, um artigo, ou singela divulgação que seja. Já destinei à fragmentação milhares de folhas de sulfite, cópias cujo teor de grande simplicidade, não mereceriam destaque.

Claro que, em muitos casos já passados trinta ou quarenta anos, o foco será a questão de fato ou de direito, que enseje alguma observação, sem que as partes venham a ser identificadas.

Acho que será importante comentar quando meu entendimento tiver sido superado porque — além dos que atuam com o Direito — é preciso lembrar que o Magistrado, ao dizer quem está certo ou errado, embora exerça poderes divinos, Deus não é. É até comum que as decisões proferidas pelo Juiz de primeiro grau, o da Comarca, sejam reformadas no Tribunal. Este cidadão preparado para julgar, às vezes erra.

E o vencido pode e deve recorrer ao Tribunal, visando o acolhimento de sua tese, nem que seja apenas para dizer que, assim fazendo, permitiu que o Tribunal errasse. Os Magistrados, todos eles, são seres humanos, daí …

O título deste artigo foi a expressão que ouvi de um mecânico de autos, quando compareceu à audiência onde foi por mim entrevistado, no processo de sua interdição. E de forma muito enfática. Para ofender a companheira.

O Processo já tinha alguns anos, e a esposa do interditando, vítima de grave acidente de trânsito, havia requerido sua interdição, até porque ele ficou na UTI, e em coma; mais recentemente havia recebido alta médica.

Pareceu-me que o casal já não estava bem, quando vi que chegaram à sala de audiências separadamente, cada um ao lado de seu advogado. Havia no processo laudo médico dando conta que o interditando recuperara suas faculdades mentais e, portanto, tinha condição plena da prática dos atos da vida civil. Inclusive frequentara diversos cursos profissionalizantes, até do SENAI.

Certamente ao interditando não era aceitável ficar sob interdição provisória, e que sua esposa – entre outros atos que ele não tinha condições de praticar – recebesse seus proventos previdenciários.

Diante das provas existentes nos autos, e do que constatei ouvindo-o, fiquei convencido que ele estava bem situado, nas dimensões da normalidade, de sorte que julguei a ação improcedente, permitindo que pudesse, pessoalmente, receber o auxílio doença do INSS, inclusive.

Finda a audiência, tentei com jeito – não sei se exitosamente – esclarecer que nem ele, nem sua esposa, eram ruins da cabeça. Mas acho que mais valeu ao o ex-interditando, proferir o desaforo para a esposa.

Autor é advogado militante na

Comarca de Rio Claro (OAB/SP 25.686)

E-MAIL: oliveiraprado@aasp.org.br

www.oliveirapradoadvogados.com.br

 

Publicado em 28/07/2022,  Jornal Cidade (Rio Claro/SP), Página 02.

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